quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Decisão do juiz de São Paulo sobre as terras de Vicente Pires

Processo 0112006-82.1968.4.03.6100

Autos com (Conclusão) ao Juiz em 12/12/2013 p/ Despacho/Decisão


*** Sentença/Despacho/Decisão/Ato Ordinátorio

O presente feito foi sentenciado há muito tempo, julgado em favor da União a área descrita na inicial e em contrapartida, condenando a expropriante ao pagamento da indenização pela área expropriada. A indenização foi devidamente levantada pelos expropriados, restando somente a expedição da carta de adjudicação para pôr fim a demanda, satisfazendo aos interesses das partes nos termos do comando judicial transitado em julgado.Contudo, após a expedição da referida carta de adjudicação, as partes noticiam nos autos que a Secretaria do Patrimônio da União determinou a instauração de Comissão de Demarcação, mediante a Portaria n. 210, a fim de atender a legislação de Georreferenciamento de Imóveis Rurais, detectando uma área excedente em relação ao que mencionava na matrícula do imóvel expropriado.Diante disto, houve a recusa pelo Oficial do Cartório de Registro de Imóveis do Distrito Federal para o registro da carta de adjudicação, sob o argumento de que não há qualquer indicativo acerca da localização exata dos 1.807,4460 ha pertencentes a União, dentro da área total encontrada em razão da demarcação administrativa.Em razão deste fato incomum, que apontava uma área excedente dentro da matrícula do imóvel expropriado nos autos e de suma importância, posto que sem a definição exata da área pertencente a União, não seria possível o registro da carta de adjudicação e, portanto, a concretização da prestação jurisdicional, surgiram duas hipóteses: a União desapropriava o restante da área, como queriam os expropriados ou restante permanecia com os antigos proprietários, como era do interesse da União.A União não pretendia adjudicar área excedente, uma vez que isto não fora estabelecido no pedido inicial e nem este juízo poderia acolher tal situação, pois configuraria inovação nos contornos da demanda transitada em julgado. Todavia, por entender que havia um relevante motivo social para atender ao pedido formulado pela União na concretização do Projeto Urbanístico - Setor Habitacional Vicente Pires, este juízo determinou a adjudicação nos moldes da demarcação apresentada pela União, dos exatos 1.807,4460 hectares, conforme a metragem requerida na inicial e transitada em julgado. Ressalte-se o parecer acostado aos autos, no qual a União menciona: "Constata-se do exame dos autos que, após a decisão judicial que determinou a expedição da carta de adjudicação, a Secretaria do Patrimônio da União, por meio da Portaria n. 210, de 27/06/2008, publicada no D.O.U., em 30/06/2008, constituiu a Comissão de Demarcação, com a finalidade de executarem os trabalhos técnico de medição do imóvel denominado "Torto" ou "Brejo", onde se localiza o setor habitacional Vicente Pires.Com base em acurado trabalho de campo, originado a partir de informações contida nos documentos constantes do processo judicial de desapropriação, relativas à descrição do imóvel, marcos, azimutes, limites, confrontações, coordenadas geográficas, bem como demais dados técnicos pertinentes à disposição da Administração, a Gerência Regional do Patrimônio da União no Distrito Federal procedeu, com esmero ímpar, à identificação, por meio de procedimento demarcatório, da área desapropriada pela União, nos termos dos documentos de fls. 69/405, tendo participado do referido procedimento, inclusive, os moradores da região e os confrontantes da área.Como dito, no curso dos trabalhos verificou-se que a matrícula n. 154.305, na verdade, alberga uma área de 2.152,1932 hectares, ou seja, constatou-se uma diferença a maior de 344,7472 hectares em relação à área desapropriada pela União. A partir de então, com base em atuação administrativa pautada na legalidade, houve por bem a Comissão de Demarcação identificar onde se situaria a área de 1.807,4460 hectares, pertencentes à União, dentro do total correspondente à matrícula do imóvel.Evidente que a medição e identificação do terreno efetuada pelos especialistas de hoje, em razão dos avanços tecnológicos que trazem instrumentos precisos de localização - por meio de satélite - da posição de um indivíduo ou de um marco qualquer no globo terrestre, muito difere daquela realizada no início da década de sessenta, justificando-se, pois, a inexatidão das medições antigas". (fl. 2690/2691)Note-se que para o julgamento da lide apresentada nos autos, este juízo não se pautou em regras ou normas criadas por ele próprio, mas sim por motivos que o levaram a considerar certas circunstâncias de fato e de direito, em especial a Demarcação Administrativa até então considerada perfeita, válida e eficaz.No que se refere à ação rescisória proposta contra a decisão deste juízo (que em sede de tutela antecipada, restou determinado que fosse oficiado o 3º Registro de Imóveis do Distrito Federal para suspender a matrícula 154.605 e as matrículas dela derivadas), cumpre esclarecer que a decisão rescidenda foi proferida de acordo com a sentença transitada em julgado e de forma coerente com as informações assentadas nos autos pelas partes interessadas, razão pela qual não prospera qualquer alegação de que a decisão que se pretende rescindir foi proferida num ato desprovido de qualquer fundamentação válida. Pelo contrário, tendo a ação desapropriatória a finalidade de transferir a propriedade para a União da área registrada sob a matrícula n. 154.305 do Cartório do 3º ofício de registro de Imóveis do Distrito Federal, de propriedade do Espólio de Eduardo Dutra Vaz, com extensão de 1.807,4470 hectares, a ordem deste juízo sempre foi nestes termos, conforme pode se observar:(fl.2616/2617):"...Assim sendo, diante da ordem emanada pelo Tribunal, providencie a parte autora as cópias necessárias para expedição da nova carta de adjudicação, ressaltando que a área a ser adjudicada pela União deverá ser aquela inicialmente discutida nos autos, constante da peça inicial e do decreto expropriatório, avaliada no laudo pericial e acolhida na sentença e, ainda, com os mesmos elementos descritivos contidos na matrícula 154.305 do 3º Ofício do Registro de Imóveis do Distrito Federal, oriunda da Transcrição nº 3.994 de Planaltina, cuja área totaliza 1.807,4470 hectares.Int". (Fl.2720/2723): "...Sendo assim, acolho o pedido da União para que seja expedida nova carta de adjudicação, para registro da área pertencente à União (1.807,4470 ha), nos termos do memorial descritivo apresentado, em consonância com o ato administrativo demarcatório da Comissão de Demarcação instaurada pela Portaria nº210, de 27.06.2008..."(Fl. 2796): "Fl.2791/2795: Conforme consta na decisão de fl.2720/2723, a União adjudicou exatamente a área de 1.807,4470 ha, nos termos do ato administrativo demarcatório da Comissão de Demarcação instaurada pela Portaria nº 210, de 27.06.2008. Ou seja, não há que se falar em aumento da área da União, além dos 1.807,4460 ha como mencionou a parte requerente. Fl. 2787: Tendo em vista o cumprimento do ofício de fl. 730/2010, remetam-se os autos ao arquivo". (fl.3217/3219):"...Sendo assim, não havendo qualquer justificativa para que o registrador ignore a ordem emanada por este juízo, expeça-se carta precatória para INTIMAÇÃO PESSOAL do Oficial de Registro de Imóveis de Taguatinga/DF, para que cumpra, no PRAZO MAXIMO DE 48 HORAS (quarenta e oito horas), a determinação de fl.2720/2724 e proceda a retificação da matrícula nº 154.305, registrado no 3º Ofício de Registro de Imóveis de Taguatinga, para constar a área total de 2.152,1932 ha; bem como o desmembramento da referida matrícula em duas áreas: a primeira contendo as descrições e confrontações apresentadas pela União, no total de 1.807.4470 ha..." Este juízo determinou por mais de uma vez que se cumprisse a adjudicação da área de 1.807,4470 hectares, objeto da matrícula nº 154.305, em favor da União, porque essa era a decisão transitada em julgado nos autos.Em contrapartida, determinar que fosse transmitida à União, a área excedente descoberta naquele momento, seria, aí sim, ofensa à coisa julgada, pois extrapolaria a metragem de 1.807,4470, objeto da desapropriação discutida nos autos. Ao mesmo tempo, se a metragem excedente descoberta dentro da mesma matrícula 154.305 não poderia ser transferido para a União, então o excedente deveria permanecer na esfera do então expropriado Eduardo Dutra Vaz.Ora, não se trata de instaurar de ofício uma ação discriminatória, demarcatória/divisória, no âmbito do cumprimento da sentença da ação expropriatória, pois não foi este juízo que determinou um nova medição da área. Ocorre que, como já exaustivamente esclarecido, a União apresentou novas medições, colhidas pela comissão administrativa de demarcação, que extrapolavam a medição anterior e que não poderiam ser transferidos para a União porque não era esse o objetivo traçado na presente desapropriação. Ou seja, este juízo não estava violando regras de competência absoluta, tampouco dispositivos literais de lei, posto que a ordem nada mais era do que a satisfação do comando transitado em julgado, em sentença proferida por este juízo e, portanto, competente para determinar o seu cumprimento. No entanto, a investigação noticiada nos autos revela que a referida Demarcação aponta vestígios de que fora produzida de forma suspeita e eivada de vícios e também aponta pela inexistência de uma área excedente na matrícula 145.305 do Livro 2 - Registro Geral no Cartório do 3º Ofício de Imóveis do Distrito Federal.O referido laudo tem como objetivo analisar e descrever as terras, que foram expropriadas no presente feito, sendo que os peritos concluíram, em síntese, que:- A Comissão de Demarcação instaurada pela referida Portaria nº 210 de 27/06/2008 executou uma demarcação de terras sem o formalismo necessário, eivada de vícios materiais graves, em desconformidade com a legislação de georreferenciamento de imóveis rurais, da Lei de Registros Públicos e da legislação sobre a demarcação de imóveis. - Os integrantes da demarcação não possuem habilitação formal, sendo que há indícios de que parte dos trabalhos da Comissão teriam sido executadas por profissionais estranhos à referida Comissão. - Há vestígios de que, na pendência do processo administrativo, houve inovação artificiosa de estado do marco pertencente ao limite fundiário do imóvel da matrícula 145.305 (última cabeceira do córrego Cana do Reino), fazendo surgir um remanescente de aproximadamente 136 ha, sendo que parte desse remanescente coincide com terras de outras matrículas;- O memorial descritivo resultante da Comissão de Demarcação diverge da descrição constante na matrícula 145.305 do Livro 2 - Registro Geral do Cartório do 3º Ofício e Imóveis do Distrito Federal, posto que modificou o estado de um marco crucial no perímetro (última cabeceira do córrego Cana do Reino); - A Comissão apurou a área do imóvel como sendo de 2.152,1932 ha, ao contrário da área enunciada no registro onde consta a área de 1.807,4470 ha, por força da alteração deliberada dos limites do imóvel; - Há vestígios de que os limites fundiários da Matrícula n. 145.305 do Livro 2 - Registro Geral no Cartório do 3º Ofício de Imóveis do Distrito Federal foram alterados em decorrência dos atos produzidos pela Comissão de Demarcação, instituída pela Portaria 210 e sobrepõem-se com terras de propriedade da TERRACAP, objeto das matrículas 54.275 do 2º Ofício do Registro de Imóveis do Distrito Federal e matrículas nº 90.977, 90.972 do 3º Registro de Imóveis do Distrito Federal.Nos termos da Súmula 473 do STF, "A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial". Em suma, os atos nulos não originam direitos.Conforme fls. 3534/3535, este Juízo foi informado pela Secretaria do Patrimônio da União que foi deliberada nova demarcação administrativa na área objeto do presente feito, por meio da Portaria n. 210, de 29 de julho de 2013, com prazo de conclusão de 6 (seis) meses a partir da publicação da referida Portaria.Diante do exposto, considerando a constituição de nova Comissão de Demarcação, ANULO as decisões de fl. 2720/2723 e fl. 3217/3219. Torno sem efeito a Carta de Adjudicação expedida nos autos.Oficie-se ao 3º Cartório de Registro de Imóveis do Distrito Federal.Oficie-se ao Tribunal Regional da Terceira Região, encaminhando cópia desta decisão e de fls. 3534/3535 para instrução nos autos da ação rescisória nº 0030374-57.2012.4.03.0000.Traslade-se cópia desta decisão para os autos da ação ordinária n. 0024632-55.2010.403.6100.Int. 

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