sexta-feira, 7 de março de 2014

Mensalão do PT: Mensaleiros começam a descontar a pena

Condenados apostam em benefícios previstos em lei para reduzir o tempo na cadeia. Até o fim do ano, será possível diminuir dois meses





Delúbio Soares conseguiu emprego na CUT, mas teve o benefício de trabalhar fora da cadeia suspenso pela VEP. ...

Passados quase quatro meses desde que os primeiros condenados da Ação Penal 470 começaram a cumprir a prisão em Brasília, a Justiça do Distrito Federal concedeu a pelo menos quatro sentenciados o perdão de parte da pena, em virtude de remição por trabalho ou estudo. O empresário Marcos Valério, cujo período total de reclusão ultrapassa os 37 anos, é o mensaleiro com mais dias oficialmente remidos até agora: oito. Esse tempo tende a aumentar para todos os réus, pois o juiz da execução penal recebe periodicamente os pedidos de remição feitos pelos advogados de defesa.

Caso aproveitem o tempo livre para trabalhar, condenados do mensalão poderão descontar da pena, ao longo de 2014, até dois meses e 10 dias. Esse é o saldo possível para quem trabalhar todos os 210 dias úteis que ainda restam no calendário oficial do DF este ano. A Lei de Execução Penal estabelece que, a cada três dias de labuta, o preso pode ter um perdoado no total da pena (veja quadro). O cálculo vale tanto para detentos do regime fechado, caso de Valério, quanto os presos em semiaberto, como o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Ele está trabalhando na biblioteca do Complexo Penitenciário da Papuda, mas não teve nenhum dia remido oficialmente pela Justiça até agora.

Além do trabalho de organizar os livros da biblioteca do presídio, Dirceu aposta na remição pela leitura para diminuir o tempo de prisão. Segundo advogados do ex-ministro, ele já teria lido mais de 15 obras desde que chegou à Papuda. A pretensão de Dirceu, entretanto, pode não se concretizar. É que, segundo a Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe), ligada à Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal, o instituto do perdão de pena por meio da leitura de livros aguarda uma portaria de regulamentação, em estudo na Vara de Execuções Penais (VEP) desde o ano passado.

O que existe no DF, segundo a Sesipe, é um projeto piloto, com detentos da Penitenciária I, unidade que integra o Complexo da Papuda. Dirceu está no Centro de Internamento e Reintegração (CIR). Para que a remição por leitura possa valer para toda a massa carcerária, inclusive para os detentos do processo do mensalão, é aguardada a regulamentação por parte da VEP. A assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios (TJDFT), que responde pela VEP, não foi localizada ontem pela reportagem. O perdão da pena por meio da leitura tem sido instituído por cada unidade da Federação, dentro de parâmetros próprios. Não há lei federal estabelecendo critérios, apenas uma recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de novembro de 2013, para que os tribunais adotem a prática. 

Além do operador do mensalão, Marcos Valério, três condenados no julgamento da Ação Penal 470 já têm dias remidos oficialmente, conforme os respectivos andamentos processuais na VEP. O publicitário Ramon Hollerbach, preso na Papuda em regime fechado, teve lançados oito dias remidos. Já o ex-deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP) e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares têm quatro dias descontados da pena final, embora o primeiro só tenha cumprido dois dias de expediente em uma empresa alimentícia no Núcleo Bandeirante. A explicação se encontra no fato de ele ter obtido o benefício enquanto estava preso na Papuda, por meio de trabalho interno ou estudo.

Prisão domiciliar

De olho na possibilidade de obter a redução de um dia da pena para cada três dias trabalhados, todos os sentenciados que cumprem pena em Brasília conseguiram encontrar uma atividade, com exceção do ex-deputado José Genoino (PT-PT), que ficou menos de uma semana na Papuda, em novembro. Ele foi autorizado a cumprir prisão domiciliar devido a problemas de saúde.

Os quatro mensaleiros que já obtiveram autorização para trabalho externo na capital federal conseguirão mais rapidamente a progressão de regime — do semiaberto para o aberto. O ex-assessor do PL (atual PR) Jacinto Lamas já trabalhou 30 dias. Portanto, até o momento, tem 10 dias remidos, embora o benefício ainda não tenha sido lançado no andamento processual. Delúbio, por sua vez, que compareceu ao serviço por pelo menos 27 dias na Central Única dos Trabalhadores (CUT), ainda não teve lançados os nove dias remidos a que tem direito. Por enquanto, ele aparece com somente quatro, mas o número deve ser atualizado. O ex-tesoureiro começou a trabalhar em 21 de janeiro, mesma data que Jacinto Lamas. O direito de trabalhar do petista, no entanto, acabou suspenso em 27 de fevereiro, após suspeitas de privilégios obtidos no Centro de Progressão Penitenciária (CPP).

Desconto no castigo

Veja quem são os condenados que já têm oficialmente dias remidos lançados no andamento processual do TJDF

SITUAÇÃO OFICIAL

Marcos Valério 

Empresário

Benefício: 8 dias

Pena total: 37 anos, 5 meses e 6 dias


Ramon Hollerbach 

Publicitário

Benefício: 8 dias

Pena total: 27 anos, 4 meses e 20 dias


Valdemar Costa Neto 

Ex-deputado federal

Benefício: 4 dias

Pena total: 7 anos e 10 meses


Delúbio Soares 

Ex-tesoureiro do PT

Benefício: 4 dias

Pena total: 6 anos e 8 meses

* Teve o trabalho externo suspenso

PREVISÃO

Veja quanto os condenados que têm trabalho externo devem conseguir de desconto na pena desde que começaram a atuar fora da cadeia até o momento


Delúbio Soares

Dias trabalhados: 27

Benefício: pelo menos 9 dias remidos 

* Teve o trabalho externo suspenso


Valdemar Costa Neto

Dias trabalhados: 2

Benefício: nenhum dia remido por trabalho externo


Bispo Rodrigues

Ex-deputado federal

Dias trabalhados: 21

Benefício: pelo menos 7 dias remidos

Pena total: 6 anos e 3 meses

Jacinto Lamas

Ex-assessor parlamentar

Dias trabalhados: 30

Benefício: pelo menos 10 dias remidos

Pena total: 5 anos

>> Os presos que trabalham dentro do Complexo Penitenciário da Papuda também terão o direito a contabilizar um dia remido para cada três dias trabalhados. No entanto, a Subsecretaria do Sistema Penitenciário não informa quem está em atividade dentro do presídio


Regras

Há duas formas previstas em lei federal para que presos dos regimes fechado e semiaberto descontem dias da pena: estudo e trabalho. Algumas unidades da Federação têm inovado com outros instrumentos. Saiba mais: 

Trabalho

A cada três dias de trabalho formal — devidamente autorizado pela Justiça —, o preso tem um dia da pena perdoado. Esse trabalho pode ser feito dentro ou fora do presídio. 

Estudo 

Presos têm um dia descontado da pena a cada 12 horas de frequência escolar, desde que divididas, no mínimo, em três dias. Vale para atividade de ensino fundamental, médio (inclusive profissionalizante), superior ou de requalificação profissional. No DF, cursos a distância em diferentes áreas podem ser usados por presos do regime fechado para remição de pena.

Leitura

Algumas unidades da Federação vêm implantando a remição de pena por leitura. Embora adotem critérios próprios, tendem a se basear em portaria que regulamenta a política no sistema penitenciário federal, em que cada obra lida e resenhada rende quatro dias a menos da pena. O limite é de 12 obras em um ano. Alguns estados fizeram leis, outros baixaram portarias. No DF, existe um projeto piloto, mas falta regulamentação. 

Atividades extracurriculares

A participação em atividades culturais, esportivas, de saúde, entre outras ligadas a um projeto pedagógico, servem para remir pena em algumas unidades da Federação, como no Rio de Janeiro. O Conselho Nacional de Justiça aprovou uma recomendação, em novembro passado, para que os tribunais considerem tais atividades para desconto de pena. No DF, não há esse tipo de remição.

Delúbio quer voltar ao CPP

A defesa do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares vai apresentar hoje à Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal um pedido para que ele possa voltar a trabalhar na Central Única dos Trabalhadores (CUT). O criminalista Arnaldo Malheiros, advogado do petista, alega que o cliente não recebeu qualquer privilégio no presídio. Ele acrescenta que não há justificava para que o condenado no julgamento do mensalão permaneça impedido de trabalhar durante o dia.

A VEP suspendeu, na semana passada, os benefícios externos de Delúbio, que, em janeiro, havia sido transferido do Complexo Penitenciário da Papuda para o Centro de Progressão Penitenciária (CPP), depois de autorizado a iniciar o trabalho na CUT. Na última sexta, o ex-tesoureiro foi levado de volta para a Papuda, sob a justificativa de que teria recebido regalias ilegais no cárcere, como uma refeição com feijoada e o privilégio de ser buscado diariamente dentro do pátio do CPP por um carro da CUT. O caso vai ser investigado. “Não há nem houve privilégio nenhum para ele, que está cumprindo toda a pena à risca. Não se aponta nenhum fato concreto relativo ao Delúbio”, diz Arnaldo Malheiros. (DA)


Fonte: RENATA MARIZ e DIEGO ABREU - Correio Braziliense - 06/03/2014

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