segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Arruda: Nova renúncia e adeus à política

Candidato do PR diz que não perdeu eleição e foi derrubado no tapetão pelos petistas. Agora, vai entrar de corpo e alma na campanha.



José Roberto Arruda dormiu na sexta-feira por volta da 1h. Duas horas depois, acordou. Foi para o computador e escreveu um testemunho. Mais uma vez, precisava elaborar uma renúncia. A terceira despedida em duas décadas da carreira política. Desta vez, no entanto, tenta deixar parte do legado para uma sucessora, a mulher, Flávia Peres Arruda. Foi a opção que encontrou depois de perder sucessivas batalhas judiciais e trombar com a Lei da Ficha Limpa. Fora das eleições, ele diz que vai sair também da vida pública. ...

Vai mergulhar na campanha, pedir votos para a dupla Jofran Frejat e Flávia e buscar, por meio deles, vencer os adversários. Em entrevista ao Correio, o ex-candidato ao Palácio do Buriti ataca os adversários do PT, a quem acusa de tentarem levar a eleição no tapetão. Arruda jura que não terá participação num eventual governo conduzido pela chapa que apoia e vai se dedicar agora à família.

No episódio da violação do painel, Arruda disse que se sentia como se estivesse assistindo ao próprio velório. Na crise da Operação Caixa de Pandora, descreveu a cena como um grande desastre de trânsito em que há muitos feridos, alguns mortos. Desta vez, ele define o momento como uma injustiça, uma frustração. Afirma que sente a dor de uma mãe que tem um filho com deficiência, mas que transforma a adversidade num projeto de vida. A seguir, cenas dos próximos capítulos.

O senhor tem um capital político, conforme as pesquisas mostraram, que é seu. Como pretende administrar esse capital político daqui para frente?

Achava que era meu. Mas hoje percebi que é daqueles que me dão o capital político. É a primeira vez que vejo de forma clara: a minha responsabilidade com as pessoas, com a população, é maior do que a minha ambição pessoal, do que o meu projeto político. A única maneira de honrar essa confiança e esse respeito das pessoas é apoiando um projeto que acredito para poder resgatar Brasília. Por isso, a escolha do Frejat. É o homem mais preparado, mais experiente para levar a cabo esse projeto. Por isso, a escolha do Gim, o senador que mais traz dinheiro para Brasília. E a presença da Flávia na chapa, até contra a vontade dela, é para dar o sinal claro ao meu eleitor que eu estou de corpo e alma nessa campanha.

O senhor vai fazer campanha? 

Vou fazer campanha. Vou para a rua, vou fazer tudo o que quiserem de mim. Estou à disposição do Frejat e do Gim. Vou a todas as comunidades onde assumi compromisso. Vou voltar com eles, para dizer que eles honrarão os meus compromissos. Todos os compromissos que eu assumi, do pequenininho ao maior, estou convencido de que serão honrados por essa chapa que vou apoiar. Vou de corpo e alma para a campanha.

Qual vai ser o seu papel no próximo governo?

Nenhum papel. Aí, a gente tem que saber o limite das coisas. Uma coisa é usar o meu capital político para apoiar uma chapa, para não deixar órfão o meu eleitor, para que esses segmentos majoritários da população que me apoiam não fiquem sem opção. Depois que eles ganharem, aí é com eles. Porque, senão, seria uma interferência absolutamente indevida. Eu sei o meu lugar. A partir daí, acho que mereço um descanso. Vou cuidar das minhas filhas, das minhas netas. Vou ser do lar. Deixa que a Flávia agora trabalhe.

E qual será o papel da Flávia?

O principal papel é avalizar esse compromisso e o cumprimento desse acordo político, que é muito claro, transparente, não tem nada embaixo da mesa. O compromisso político é honrar todos os compromissos que fiz com a população que meu deu no último trecking 44% de intenção de voto. É isso.

Fica difícil acreditar que, com a sua história política, o senhor não vá participar desse governo, inclusive porque a presença da Flávia indica isso.

É claro que a presença da Flávia é para honrar os meus compromissos. Mas dou aqui uma palavra definitiva: eu não exercerei nenhum cargo. Ponto.

Mas essa questão de não exercer cargo, o ex-presidente Lula não exerce cargo no governo Dilma e tem influência. O senhor seria o Lula do DF?

Não, e vou te explicar por quê. Os caminhos de Deus, né? O Frejat é muito mais competente e muito mais preparado do que eu. Tivemos caminhos diferentes, ele foi com mais paciência, eu com mais ímpeto, mas ele não teve os acidentes de percurso que eu tive, exatamente por ter uma velocidade mais moderada. O Frejat é muito bom de debate, é articulado, conhece Brasília como ninguém. Tem uma obra por Brasília que ninguém pode negar. Não estou indicando uma solução doméstica, uma solução menor. Estou saindo da política.

Mas havia resistências ao nome dele dentro da chapa. Essa conversa de hoje como foi?

Absolutamente redonda. Estavam presentes, além do Roriz, suas duas filhas, o Gim, o Fraga, o Luiz Estevão, Salvador Bispo, dona Weslian e todos os presidentes de partido.

O senhor não acha que essa desistência será usada pelos seus adversários como mais um passo em que havia um compromisso de que ficaria até o fim e agora sai…

Olha, os adversários sempre transformam os gestos mais nobres em coisas ruins, então deles não espero nada. A minha consciência diz, em primeiro lugar, que eu não desisti. Fui até o final. Fui até o recurso do Supremo (Tribunal Federal). E se eu tivesse obtido a liminar, eu iria em frente. Agora, ir em frente, tendo perdido no Tribunal de Justiça, tendo perdido no TRE, tendo perdido no TSE, tendo perdido no STJ e não obtendo a liminar no Supremo, aí era uma leviandade com o meu grupo político e com a população que me apoia. Se o não registro da minha candidatura se confirmasse, eu já não poderia indicar mais ninguém. Então, a população diria ‘puxa vida, mas você me deixou na mão’. Então, eu não desisti. Infelizmente, não consegui o registro da minha candidatura no tempo hábil.

Valdemar Costa Neto teve alguma participação?

Ele conversou com Salvador Bispo, presidente regional do PR. Ele nos delegou a decisão desde o início. Inclusive o Agnelo o visitou pessoalmente lá na Papuda para ver se ele desistia, e ele disse que não desistiria.

Mas havia uma pressão de uma parte do PR por Frejat…

Eu não sei, mas uma das coisas que pesou em favor do Frejat foi a manutenção do número, 22. Se fosse o Gim ou o Fraga, ou a Liliane, não poderia manter o número.

Teve pressão política na Justiça?

Não sei. Eu disse que pode ter havido. Eu diria o seguinte: foi muita exceção num caso só. Há um poema que gosto muito que diz assim: ‘Num dia, entraram no meu jardim e roubaram uma flor, eu não disse nada. No outro dia, pisotearam o meu jardim e mataram o meu cão e eu não disse nada. Finalmente, entraram na minha casa e calaram a minha voz. Como eu não tinha dito nada antes, eu também não pude dizer nada’. Como este talvez seja o derradeiro ato da minha vida pública, eu deixaria isso de reflexão para os homens de bem que têm responsabilidades institucionais neste país. Será que excepcionalizar o entendimento de uma lei para um caso específico não abrirá um grave precedente que poderá provocar graves ameaças institucionais? Não sei se estou falando na hora que roubaram a flor ou mataram o cão, mas sei que o ato que praticaram contra mim pode ser, a médio prazo, um ato contra as instituições democráticas.

O senhor errou nessa fase da campanha?

Quando vejo um político na televisão dizendo ‘Vote em mim porque eu nunca errei’, sabe como eu traduzo? Nunca fez nada. Todo mundo que faz erra. Essas vestais que nunca erraram são um embrulho de presente sem nada dentro.

Aquele vídeo na (casa do advogado Eri Varela) foi uma armadilha?

Primeiro, não disse nada do que tenha de me arrepender. Posso dizer aqui na entrevista: que visitei o presidente Fernando Henrique, que analisei a minha situação política e jurídica com ele. Analisar votos também é comum. Mas precisa ser visto é quem gravou e por que gravou? Há versões de que foi gravado pelo Ministério Público. Quais interesses escusos, sinceramente não sei. O que sei e afirmo é que o PT, como partido político, aparelha o Estado, joga nos subterrâneos do poder, joga sujo e gosta de ganhar no tapetão. Eu não estou perdendo esta eleição no voto. Estou sendo tirado da eleição no tapetão. Todo mundo sabe que o coronel Leão grava as pessoas contra a lei. Ninguém tem coragem de dizer. Eu tô aqui dizendo: o coronel Leão grava as pessoas com equipamentos da Casa Militar. Já disse, na polícia, esse tempo todo fui seguido com carros com chapa fria.

Se tivesse que resumir em uma palavra seu sentimento agora, qual seria?

Injustiça, frustração e dor. Quero transformar esse sentimento numa energia positiva que ajude a mudar a cara de Brasília. Posso dar um exemplo? Esses dias, eu encontrei na rua uma senhora que tem um filho com grande deficiência física, na cadeira de rodas, senti uma emoção grande. Ela me disse: ‘No começo, quando ele nasceu, senti uma dor terrível, mas depois eu transformei a minha dor num projeto de vida. Hoje, eu cuido de 80 crianças com deficiência’. Com todo o respeito, sem comparar a minha dor com a dela, eu digo: quero transformar todo o meu sentimento de dor, de indignação, em energia positiva. É com alegria que quero me transformar em cabo eleitoral do Frejat e do Gim. Eu não sou do mal. Não quero fazer o mal. Peco pela minha excessiva boa-fé. Nunca faço mal para ninguém e acho que ninguém vai me fazer mal.

Algum sentimento de ciúme político da Flávia?

Não, nenhum. Eu tenho amadurecimento político para fazer por ela o que ela fez por mim: eu vou cuidar bem das crianças.

Como o senhor vislumbra esse futuro? O senhor não está deixando a vida pública. 

Eu estou deixando a vida pública.

Os seus advogados o aconselharam a desistir?

Não. O dr. Alckmin me disse uma frase muito forte: ‘Se o senhor desistir, me dá vontade de desistir do direito’. Ele disse que havia uma súmula vinculante do Supremo que proíbe a mudança de jurisprudência no processo eleitoral. Se eu tivesse a liminar, eu iria. Mas ir sem liminar não é colocar em risco a minha carreira, e sim todo um projeto político abraçado por mais de 40% da população. 

O presidente do TSE, Dias Toffoli, foi muito veemente contra a argumentação do seu advogado…

Diria o seguinte: quem sou eu para fazer juízo de valor de pessoas tão preparadas que chegaram à Suprema Corte deste país? Eu estou aqui no choro do perdedor. Eu me considero injustiçado? Me considero. Mas no limite disso continuo respeitando o Poder Judiciário do meu país. 

As pessoas vão entender a mudança?

Nesta era da internet, as informações circulam rápido. O Frejat vai ser a Marina de Brasília e vamos ganhar no primeiro turno.

"Todos os compromissos que eu assumi, do pequenininho ao maior, estou convencido de que serão honrados por essa chapa que vou apoiar. Vou de corpo e alma para a campanha”

"Vou cuidar das minhas filhas, das minhas netas. Vou ser do lar. Deixa que a Flávia agora trabalhe”

"Tranquilamente, analisando o cenário, sem paixão, estou deixando a vida pública e tentando transferir o meu legado para aqueles que considero preparados para cumprir os meus compromissos”

"Eu estou aqui no choro do perdedor. Eu me considero injustiçado? Me considero. Mas no limite disso continuo respeitando o Poder Judiciário do meu país”


Fonte: Por ANA DUBEUX, ANA MARIA CAMPOS e DENISE ROTHENBURG - Correio Braziliense -

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