quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Bolsa Pesca: A dois meses do fim do ano, gastos já são recorde

O Seguro Pescador Artesanal, também conhecido como Bolsa Pesca, já desembolsou R$ 2,1 bilhões em 2014



O valor é maior do que o total gasto durante todo o ano passado: R$ 1,8 bilhão. O benefício foi criado no início dos anos 1990 para assegurar amparo ao pescador artesanal, sob a forma de transferência monetária, durante o período de defeso, quando os peixes se reproduzem e a pesca é proibida.

A dotação prevista para 2014 é de R$ 2,4 bilhões, o valor é 32% superior aos R$ 1,8 bilhão autorizados em 2013. O MTE afirmou ao Contas Abertas no final do ano passado que o aumento se devia ao reajuste de 6,78% da bolsa. A Pasta ainda previa aumento de 4,74% no número de pescadores (média histórica)...

Bolsa Pesca

O número de beneficiários do programa cresceu significativamente desde a criação. Em 2003, 113.783 pescadores recebiam os recursos. Já em 2012, essa quantidade alcançou 967.233 beneficiários. No ano passado, 830.808 pescadores se beneficiaram da bolsa. A expectativa é que 884.823 pescadores recebam as verbas neste ano.

O Bolsa Pesca já foi investigado por órgãos de controle externo e interno. O Tribunal de Contas da União (TCU), por exemplo, com a base de dados do Sistema Seguro-Desemprego, constatou fragilidades que ocasionam concessões indevidas de parcelas do auxílio a trabalhadores formais.

Entre as situações em desacordo com a legislação, há pagamento de parcelas aos beneficiários reempregados, acumulação de parcelas do seguro com benefícios da previdência e com remuneraçoes pagas pela administração pública.

Segundo análise feita pelo TCU, os casos demonstram “lacuna” no cruzamento de dados e ocorrem ainda por falhas e atrasos na alimentação dos cadastros de empregados e desempregados (Caged) e de informações sociais (CNIS). Em nova auditoria já concluída e que está no gabinete do relator, ministro Augusto Sherman, a Corte analisa a “eficácia dos controles internos” da concessão do seguro.

Neste ano, a Controladoria Geral da União (CGU) também encontrou irregularidaes no programa. Em relatório que cruzou dados entre janeiro de 2012 e junho de 2014. Entre os problemas encontrados estão pescadores que receberam o benefício, mas cujo CPF não está na base da Receita Federal, e, beneficários menores de 18, que não poderiam receber os recursos. Além disso, favorecidos que estavam com o Registro Geral da Pesca cancelado e pescadores industriais também estavam na lista de beneficários. A Controladoria ainda apontou que entre os beneficiários estavam pessoas com vínculo empregatício, sócios de empresas privadas e até servidores públicos.

Problemas antigos

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou estudo realizado pelos pesquisadores André Gambier Campos e José Valente Chaves sobre os problemas do benefício. De acordo com os pesquisadores, em 2010, em todo o país, 584,7 mil pessoas receberam ao menos uma parcela do Seguro Defeso. No entanto, segundo o Censo do mesmo período, havia apenas 275,1 mil pescadores artesanais no país. Ou seja, o programa estava abrangendo grupos que, aparentemente, não exercem a profissão.

Ainda segundo o estudo, as discrepâncias geraram uma espécie de sobrecusto no valor de R$ 638,4 milhões (valor corrente em 2010). “Em algum grau, isso significa uma descaracterização do programa, que pode muito bem ameaçar sua continuidade no futuro – remoto ou até mesmo presente. E, dados os vários méritos do Seguro Defeso, não só sociais como também ambientais, esse certamente não é um cenário desejado”, conclui o relatório.

Contenção das Fraudes

Segundo o Ministério da Pesca e Aquicultura, no Balanço 2013 do órgão, o governo federal trabalhou no ano passado para valorizar a profissão de pescador profissional. “Com o Recadastramento Nacional, (o governo) criou metodologias para coibir as fraudes ao Seguro Defeso e manter apenas o verdadeiro pescador de posse da Carteira Nacional de Pescador”, afirma.

A partir do lançamento do Plano Nacional de Combate à Pesca Ilegal, o Ministério aponta que visa garantir futuro para a pesca no Brasil. “A meta é acabar com a pesca ilegal e não declarada, regularizar permissões e autorizações de pesca em todo o território nacional e favorecer os pescadores e armadores que atuam conforme a legislação vigente”, explica no Balanço.

Além de garantir o amparo ao pescador durante o período do defeso, o Seguro também tem o objetivo de ajudar na preservação de várias espécies de peixes, crustáceos, etc, cuja reprodução ocorre justamente durante o período do defeso. A lei garante ao pescador receber tantas parcelas quantos forem os meses de duração do defeso, conforme portaria fixada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). Cada parcela equivale a um salário mínimo, que geralmente é pago por quatro meses.

Valores podem aumentar

O Congresso pode aprovar projeto que permite ao pescador artesanal receber seguro-desemprego em paralisação por fenômeno natural. A proposta está na Câmara dos Deputados (Projeto de Lei 7312/14) e tem o deputado André Figueiredo (PDT-CE) como autor.

O projeto prevê benefício de seguro-desemprego ao pescador profissional que exerce a atividade de forma artesanal em casos de paralisação da atividade por fenômenos naturais ou acidentais. Atualmente, segundo a Lei 10.779/03, esses profissionais recebem o auxílio durante o período de defeso, época de crescimento ou desova dos animais.

André Figueiredo argumenta, porém, que os pescadores ficam completamente vulneráveis e sem amparo do governo em “situações não contempladas no referido diploma legal que, frequentemente, levam muitos pescadores e suas famílias a viverem situações dramáticas, quando impedidos de obter seu sustento habitual”. Ele cita como exemplos a realização de grandes obras, a contaminação das águas por derramamento de óleo ou de outras substâncias e fenômenos naturais como estiagens prolongadas.

Outros projetos do Congresso também pretendem mudar as regras para o benefício. Dentre as proposta estão, por exemplo, a de estender os recursos para toda a cadeia de pesca, incluindo os que transportam, comercializam, reparam embarcações e costuram redes. Outros textos cogitam beneficiar catadores de mariscos, carangueijos, siris e guaiamus, além do texto que prevê a contemplação de pescadores que recebem auxílio-doença.

Histórico

A lei criada para regular o Seguro (Lei 8.287/1991), já revogada, era mais restritiva para a concessão do benefício. Com o advento da Lei 10.779/2003, o novo marco legal para o seguro-desemprego do pescador artesanal tornou os critérios para concessão do benefício mais flexíveis, principalmente, quanto ao período mínimo de registro de pescador profissional, que antes era de três anos e com a nova legislação foi reduzido para apenas um ano.

De 2002 para 2013, o universo de potenciais beneficiários do Seguro Defeso aumentou consideravelmente, passando de 91,7 mil favorecidos para 714 mil bolsistas. O principal requisito para solicitação do Seguro é possuir o registro de pescador profissional da pesca artesanal (RGP). Esse registro faz parte de um cadastro, cuja responsabilidade é do Ministério da Pesca e Aquicultura.

O RGP contempla todos aqueles que se dedicam à atividade pesqueira, independente de ser pesca artesanal, industrial ou profissional. Logo, o aumento do número de inscritos no RGP impacta diretamente as concessões do seguro-desemprego do pescador artesanal e qualquer alteração de definição do que é considerado pescador profissional na pesca artesanal, em tese, possibilita a concessão de mais benefícios em período de defeso.


Fonte: Portal Contas Abertas. Por DYELLE MENEZES

Nenhum comentário:

Postar um comentário