sábado, 1 de agosto de 2015

MARCAS DE UMA TRAGEDIA

O texto abaixo relata o acontecimento de meu filho em 24 de agosto de 2014






No dia 24 de agosto de 2014 quando estava indo para minha chácara, recebi uma notícia que nenhum pai gostaria de receber. Ao telefone estava meu genro que dizia: Gilberto, o Victor acabou de falecer em um acidente de carro.
Naquele momento senti meu coração esfriar e ao mesmo tempo, medo, insegurança, dúvida e muita tristeza tomaram conta da minha vida.

Claro que não acreditei, pois meu filho tinha apenas 17 anos, muitos planos para a vida e eu na verdade tinha muito mais planos para ele do que ele mesmo tinha. Não acreditei, pois as pessoas, mesmo sendo da família costumam brincar conosco e às vezes com brincadeiras desagradáveis. Eu tinha certeza de que devia estar em meio a um daqueles pesadelos horríveis e ansiava que minha esposa esbarrasse em mim para que eu acordasse.

Depois de alguns minutos percebendo desespero da minha filha pelo telefone, parecia que a verdade que minha mente insistia em não querer acreditar era verdade. Meu filho havia partido desse mundo e junto dele muitos projetos feitos por ele e que eu também como pai sonhava para ele simplesmente pararam no tempo.

Eu estava aqui em Brasília DF ele lá em Bom Despacho MG. Minha mente então teimava em pensar que poderia haver um engano. Afinal, eu não estava vendo e o que os olhos não vêem, o coração e a mente temem em não acreditar. Mas ao mesmo tempo em que vinha o descrédito da noticia, vinha a dor de não poder mais ver meu filho, falar, sorrir, e sentir ele me abraçar forte me levantando do chão como ele sempre fazia dizendo: Me dá um abraço velho. A dor aumentava por pensar que não poderia mais colocá-lo em meu colo, levá-lo para passear e encher - lhe a paciência para colocar o cinto e não colocar o braço para fora, enfim não aconteceria mais nada disso.


Naquele momento eu estava forte como sempre, me mostrando um gigante, mas no meu íntimo, naquele momento e ainda hoje, eu mal consigo ficar em pé diante da dor que parece me consumir.

Precisava naquele momento preparar o carro e a família para sair em viagem pelos 700 quilômetros que me separava da verdade. Nessa viagem até certo ponto, exatamente até Paracatu MG não me deixaram dirigir, mas como meus pensamentos estavam me matando, resolvi assumir o volante para ter uma ocupação. Neste momento eu acelerei o máximo que pude, assim poderia chegar mais rápido e ver se era verdade mesmo o que eu não queria acreditar. Durante a viagem havia centenas de Ipês floridos, cada um mais lindo do que o outro. Porém essa beleza me fazia lembrar funeral e isso me corroia por dentro. Não podia parecer fraco, nem gritar e muito menos desesperar, tinha que me conter, afinal dentro do carro estava o meu filho de 6 anos e minha filha com minha netinha. Mas com a aproximação da cidade onde estava meu filho sem vida como diziam, meus pés não queria mais acelerar, minha vontade não era mais de chegar, mas de continuar a dirigir para uma viagem sem fim, pois enquanto eu estivesse na viagem, essa verdade não seria comprovada e eu teria apenas a devastadora notícia.


Mas como todo sonho ou pesadelo chega ao fim quando se acorda, o meu sonho de que não se confirmasse a “mentira” de que meu filho de apenas 17 anos teria morrido virou pesadelo quando as 18h10 minutos eu parei o carro em frente ao velório e vi meus outros filhos e amigos vindo ao meu encontro chorando e me abraçando. E naquele momento pude ver ali da rua mesmo a urna cheia de flores e meu garoto perdido no meio delas.

Como Deus não nos abandona nunca, eis que minha esposa veio ao meu encontro, envolveu-me em seus braços, e disse aos meus ouvidos, com autoridade que Jesus Lhe concedia, algumas palavras de encorajamento que me fez lembrar do sofrimento de uma mãe de pé diante de seu filho assassinato sem ter cometido nenhum crime. Fez-me lembrar também do sofrimento que passou Maria, a mãe de Jesus, aquele que morreu por nossos pecados. Lembrar do sofrimento de Jesus e da dor de sua mãe me deu mais forças para que minhas pernas frágeis, bambas e cambaleantes me conduzissem para o que seria os últimos momentos de um pai junto de seu filho, que já não se encontrava de corpo e alma ali naquele frio ataúde frio e feio. Ali está apenas seu corpo, pois sua alma, seu sopro de vida, havia voltado para Pai Eterno.

Eu não sei se nesse momento eu tive fé ou se culpei a Deus, pois meus sentimentos se misturavam e nem eu mesmo sabia o que realmente sentia. Mas por vários momentos lembrei que a fé é a base de tudo e se nossa fé não for além do que é palpável, se Deus não significar a certeza de nossa vida que se eterniza, se a ressurreição do Cristo não for protótipo da nossa, qual será nossa esperança, qual será nosso consolo? Além disso, se seu naquele momento jogasse tudo para o alto e gritasse bem alto os meus sentimentos como ficaria meus outros filhos que ali estavam desesperados e dos amigos de meu filho morto e das demais pessoas ali presente compartilhando a minha dor?

Eu tinha que ser forte, mas apenas fingi ser forte, pois todos ali precisavam da presença de alguém que mostrasse novos horizontes para nossos olhos cansados de chorar, para os corações inconformados com a perda de quem, a nosso ver, não deveria ter partido ainda.

É difícil falar palavras de esperança quando o sofrimento fala bem alto do que nós. Mas sei, que a nossa fé realiza maravilhas e temos que lembrar muito bem que nossa vida continua.

Durante toda noite, ali junto do corpo sem vida de meu filho amado e querido, milhões de pensamentos passaram pela minha cabeça; inclusive o de estar em seu lugar. Se eu pudesse fazer a troca... Afinal, porque Deus permite que um pai tenha que sepultar um filho? A meu ver, a ordem deveria ser inversa, os filhos sepultam o pai.

Foi uma noite muito longa! Mas pior ainda foi quando o dia amanheceu e eu sabia que às 8h seu corpo seria levado para sua última morada e ali ficaria sozinho para sempre até que Jesus volte e ele possa se ressuscitar para que eu possa abraçá-lo forte novamente.

Vi e ajudei a descer ao túmulo meu filho querido e amado, doeu muito, mas a dor não parou por aí. Ao sair do cemitério recebi a informação de que meu filho poderia ainda estar vivo... Se ele não tivesse saído naquela noite para ir a uma festa com os amigos... Se ele tivesse usando o cinto de segurança... E se outros três irresponsáveis não tivesse enchido a cara de bebida e saído no trânsito dirigindo na contra mão, ele estaria vivo. Mas dói saber que ele chegou ao hospital com vida, falando e apenas apresentando uma perna quebrada. Se o
médico ansioso para trocar o plantão não tivesse dado apenas analgésico e feito um raio x da perna... Se esse médico tivesse analisado direito meu filho, não o largando abandonado em uma maca sem cuidados mais apropriados e necessários, ele não teria sido encontrado por um policial já com parada cardíaca devido aos vários traumas que passaram despercebidos por um médico ansioso para ir para casa. Se esse mesmo médico tivesse sido encontrado pela enfermeira para reanimar meu filho, ele ainda estaria vivo, mas quando encontraram o médico, ele já havia morrido. Morreu por uma sucessão de erros. Isso está doendo muito mais, isso está me corroendo por dentro, saber que muitos outros morrerão e vão morrer pelas mesmas causas que meu filho.

Só me resta chorar, pois isso é humano. É sinal de estima, de amor e solidariedade. Chorar alivia. Por isso, não faz mal que choremos, mesmo escondido. Eu sei que vou chorar todos os dias a falta de meu filho, pois ouvi dizer que as lágrimas lavam o coração e quem sabe chegue uma hora que elas consigam lavar de meu coração esta dor que me consome.

Mas sei que devo e preciso retornar à lide cotidiana, apesar da intensa saudade. Fortifiquemos nossos corações e dobremos nossos joelhos vacilantes buscando de Deus força, conforto e retomemos nossa vida.

Sei que meus filhos e minha família precisam de mim. Só a fé em Jesus Cristo é capaz de nos dar o consolo que procuramos. Diante da morte, todos os argumentos terminam. Somos limitados demais para encontrar a resposta exata que o nosso coração almeja.


Espero que essa minha pouca fé, faça que a morte deixe de ser um fantasma e se transforme em condição para um reencontro deste homem com Deus.

Que essa minha pouca fé me faça lembrar sempre que para os que crêem em Jesus Cristo e seguem seus caminhos, a morte não é o fim de tudo é o fim apenas daquilo que nos faz mal nesta terra. Que aguardemos a volta de Jesus com a esperança da ressurreição de nossos queridos.

Minha dor não é maior do que a de ninguém, mas a minha sou eu que estou sentindo. Portanto, peço a todos que relevem minhas palavras e que me ajudem a não querer vingar a morte de meu filho Victor Augusto de Camargos, mas fazer justiça contra aqueles que temem em descumprir a lei e misturar bebida e direção. E que a justiça processe e condene o médico e o hospital para que sirva de exemplo para outros, para tenhamos mais médicos de plantão nos hospitais e que os médicos de plantão não deixe outra pessoa morrer por atendimento mal feito...

Meu filho foi sepultado e nossa separação foi consumada apenas fisicamente, pois ele permanecerá vivo para sempre em meu coração.

Obrigado Deus por me dar forças para continuar, pois de acordo com a palavra no evangelho de João Cap. 11 Versículos 25-26. Disse- lhe Jesus: *?Eu sou a
ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim ainda que esteja morto, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, jamais morrerá?*.

Muito obrigado a todos que de alguma forma me amparou e trouxe forças, pois sem isso tudo teria sido muito mais difícil de suportar. Obrigado pelas orações.
Amo-te meu filho Victor, amo a todos vocês meus filhos queridos que estão passando essa dor comigo.

Gilberto Camargos

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