Amada por uns e odiada por outros tantos, Bruna Maria Peres Pinheiro, a “xerife” da Agefis (Agência de Fiscalização do Distrito Federal), age como quem não teme. Desde que assumiu o protagonismo de derrubar barracos e cercas tanto em áreas pobres como ricas da capital do país, ela tem tentado tocar a vida normalmente, sem mudanças de hábitos ou reforço na segurança.
Evangélica, Bruna preferiu intensificar as orações para espantar eventuais pragas lançadas por grileiros, deputados e quem mais a desejar mal. Ora com fervor na igreja – onde é a pastora Bruna – em casa, no carro e até no gabinete, localizado no segundo e último andar do prédio da Agefis, às margens do Eixo Monumental.
“Não repara a bagunça”, pede a diretora-presidente do órgão, enquanto, com a ajuda da assessora, limpa às pressas a mesa de trabalho.
Quem entra na sala de Bruna é recebido por ela de pé, com olho no olho e aperto de mão firme. Antes de iniciar a conversa com o Fato Online, na tarde da última segunda-feira (14), a diretora-presidente quis saber o teor da reportagem. “Estão me batendo demais”, queixa-se ela, que começa a entrevista de quase uma hora com poucos sorrisos e respostas curtas.
Bruna se diz segura e confiante em Deus. Mas, em meio a tanta pressão e ameaças, anda desconfiada no dia a dia. Recentemente, ao fazer compras em um supermercado, notou que estava sendo perseguida.
“Você é a Bruna da Agefis?”, perguntou um senhor, ao abordá-la nos corredores.
Bruna se espantou, respondeu que sim e esperou a reação. “Eu sabia. Falei para a minha mulher que era você”, emendou o intruso, antes de parabenizá-la efusivamente pelas ações contra a ocupação irregular de terra no DF. Foi um alívio.
Carreira pública
Nascida em Brasília há 48 anos, Bruna foi criada no Lago Sul e cursou arquitetura e urbanismo na UnB (Universidade de Brasília) no fim da década de 1980. Com quatro anos de formada, tomou posse na Agefis, após ser aprovada no último concurso do órgão até aqui.
A servidora pública de perfil técnico e metódico atuou em administrações como a do Paranoá e do Lago Sul, nas secretarias de Obra e de Saúde e na extinta Sucar, a Secretaria de Coordenação das Administrações Regionais.
Entre idas e vindas pelos órgãos do governo local, Bruna tornou-se uma especialista em fiscalização e profunda conhecedora da legislação vigente no DF. Como assessora ou ocupando cargos de chefia, ajudou a elaborar muitas das regras que hoje faz valer, incluindo o Código de Edificações e o Plano Diretor de Publicidade, além de diversas normas envolvendo alvarás de funcionamento.
Com a vitória de Rodrigo Rollemberg (PSB) nas últimas eleições, o nome de Bruna foi lembrado ainda durante a transição. Referiam-se a ela como uma servidora competente, organizada, corajosa e que adorava resolver problemas. Escolhido para chefiar a pasta de Infraestrutura e Serviços Públicos, o engenheiro Julio Cesar Peres a escalou para a Subsecretaria de Fiscalização de Obras. O convite foi aceito de pronto.
“Ela é uma mulher de postura, coerente com aquilo que é correto e sabe falar as verdades. Atua com conhecimento de causa e muito planejamento”, descreve o secretário Julio Cesar.
Nomeação
Às vésperas do início da gestão Rollemberg, os elogios a Bruna cresceram e chegaram aos ouvidos do então chefe da Casa Civil, Hélio Doyle, por meio da deputada distrital eleita Sandra Faraj (SD), também pastora evangélica. Doyle, que já conhecia a fama de Bruna desde o governo de Joaquim Roriz, preparou o terreno para o governador bater o martelo sobre o nome dela à frente da Agefis.
“Meu padrinho é o governador. E só”, afirma a arquiteta, refutando qualquer ligação com a deputada Sandra Faraj, além da religião em comum.
Ao topar o desafio de comandar a fiscalização no DF, Bruna Pinheiro se transformou em uma das figuras mais importantes do governo, assolado por uma crise financeira sem precedentes e carente de pautas positivas. Trabalha, em média, 14 horas por dia e, em casa, não desliga o telefone. A rotina não permite mais que ela corra na rua três vezes por semana, como de costume. Mesmo apressada, porém, não sai sem se maquiar.
Bruna está convicta do legado que pretende deixar como diretora-presidente da Agefis. As derrubadas coordenadas por ela, onde quer que seja, ilustram, sustenta ela, a missão que estabeleceu para toda a equipe: paralisar as invasões na Capital Federal, custe o que custar.
“Bruna Quebra-barraco? Pessoalmente, ninguém ainda tinha tido a coragem de me chamar disso”, reage ela, sem dar muita liberdade.
Convencimento
Com um punhado de mapas espalhados pela mesa, Bruna orgulha-se de informar que 90% das notificações na orla do Lago Paranoá, por exemplo, estão sendo cumpridas sem a necessidade de multas ou demolições.
“Os autos da agência deixaram de ser um papelzinho amarelo que as pessoas recebiam e não davam bola. Isso é resultado. Faz com que o servidor se sinta respeitado, motivado, mais do que aumento de salário”, pontua.
Com oratória de pastora, a “xerife” da Agefis não precisa se esforçar muito para dominar reuniões. Em conversas reservadas ou em reuniões de trabalho, a arquiteta enfrenta secretários, coronéis e não teme em discordar do governador.
“Não digo o que penso, o que quero dizer. Digo o que acho que tenho que dizer, na hora certa. Defendo meus pontos de vista, mesmo que as pessoas pensem o contrário. Nem sempre saio vitoriosa”, pondera.
Sentada com a postura ereta, mantendo as mãos firmes sobre a mesa e o olhar fixo em quem pergunta, Bruna se autodefine justa, não durona. Rebate cada uma das críticas de que abusa do poder conferido a ela ao ordenar que as máquinas joguem ao chão os barracos erguidos em regiões com o Sol Nascente e o Pôr do Sol, em Ceilândia.
“Não me considero arrogante nem prepotente, não acho que tenho excesso de poder, nunca tratei ninguém mal. Cumpro a legislação. Mas esta postura é minha: sou sempre muito firme nas minhas posições. E aqui (na Agefis) não dá para ser diferente, porque se você titubear, perde o controle da situação”, comenta.
Vaias e xingamentos
No início de dezembro, Bruna enfrentou momentos de tensão durante uma audiência pública na Câmara Legislativa. Moradores que tiveram casas derrubadas lotaram o plenário para vaiá-la e xingá-la. Foram longos 18 minutos de embate.
“Fui preparada. Sabia quem eram aquelas pessoas e que muitas chegaram ali em ônibus pagos por seus representantes. Ninguém gosta de ser hostilizada, mas não afetou minha identidade. Mantive minha calma, minha sensatez. Sou uma pessoa equilibrada. Talvez isso possa ser confundido com frieza”, sublinha.
A cada vez que se especula a demissão de Bruna Pinheiro, o telefone da diretora-presidente da Agefis toca com alguma mensagem do governador a apoiando, o que a leva a engrossar o discurso contra as invasões.
“Não tenho prazer algum em derrubar casa de ninguém, mas é preciso. E não vamos parar. Quando se tem convicção de que se está fazendo algo correto, fica muito mais fácil ser firme”, acrescenta.
"Intercessão"
Os desafios na Agefis têm servido de inspiração para a pastora Bruna, que costuma ocupar o púlpito para pregar aos domingos na igreja Ministério Internacional de Deus, no Setor de Indústrias Gráficas. É o único momento da semana em que ela não atende nem o governador. Antes e depois dos sermões, recebe o apoio e a “intercessão dos irmãos”.
Casada há 28 anos com um empresário da cidade, Bruna Pinheiro gasta as poucas horas vagas no cinema ou em casa, ouvindo música gospel. A aposentadoria está prevista para daqui a sete anos, quando ela vislumbra ir morar perto dos dois filhos, nos Estados Unidos.
“Meu alvo é minha aposentadoria. Pode colocar aí com todas as letras: não tenho filiação partidária nem pretensões políticas. Quero curtir minha família”, garante.
Até lá, a diretora-presidente da Agefis, Bruna Pinheiro, promete ainda quebrar muito barraco, mansão ou o que vier pela frente.
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