segunda-feira, 9 de setembro de 2013

TRANSPORTE PUBLICO DO DF DESRESPEITA CONSUMIDORES

Empresas de ônibus em Brasília desrespeitam os consumidores e deveriam ser condenadas por danos morais individuais e coletivos


O transporte público no Distrito Federal é de péssima qualidade. A afirmação é irrefutável. Os ônibus são velhos, desconfortáveis, trafegam com excesso de passageiros e sem condições mínimas de segurança. É bastante comum vermos pelas ruas do Distrito Federal ônibus quebrados ou emitindo uma quantidade absurda de gases poluentes. A omissão do Governo do Distrito Federal é um fato histórico e lamentável. As promessas governamentais de melhoria do sistema evidenciam a péssima qualidade do sistema de transporte público. A questão que nos propomos a analisar e se um serviço essencial prestando com tanto descaso é capaz de gerar ofensa aos atributos de personalidade do cidadão e, por consequência, gerar o dever de indenizar por danos morais.

Posto os fatos nos termos acima, duas interpretações exsurgem como possíveis. Para uma, a péssima qualidade do serviço prestado pelas empresas não passaria de um mero aborrecimento, de uma situação corriqueira e sem maiores consequências. Para outra corrente, essa indiferença, esse desrespeito pelo consumidor é que configura a sensação de mal-estar, de constrangimento, de humilhação e de indignidade, não é simples aborrecimento, mas, indiscutivelmente, dano moral. ...

Pensamos que a segunda corrente é a correta.  O comportamento das empresas de transporte urbano no Distrito Federal mostra-se, todos os dias, inadequado, eis que dispensam aos consumidores um total descaso. A quebra de veículos não é um fato isolado e fruto do acaso, mas da falta de manutenção e de investimentos na conservação dos veículos. O dano moral materializa-se quando há violação ao princípio da boa-fé, ocasionando angústia, humilhação ou submetendo alguém à situação capaz de violar de forma exacerbada sua higidez psíquica, bem como sua honra, imagem ou qualquer dos direitos personalíssimos tutelados no art. 5º, V e X, da Constituição Federal de 1988. (TJPB; AC 026.2011.002237-8/001; Rel. Des. Frederico Martinho da Nóbrega Coutinho; DJPB 03/09/2013; Pág. 11).

Uma coisa seria se as empresas envidassem os esforços necessários à conservação de seus veículos e, como força maior, o pneu furasse por defeito na pista. Os passageiros teriam que perder tempo, mas seria um fato aceitável, fruto do acaso e que pode acontecer com qualquer veículo. Totalmente diferente é a situação em que a empresa coloca em circulação veículos sem a devida manutenção, com problemas mecânicos e, no trajeto, o veículo, por causa da fadiga de seus componentes, apresente defeito e faça com que os passageiros percam o seu valioso tempo. Em tal hipótese, nítida e a má-fé das empresas, contrastando com a boa-fé objetiva que se espera dos prestadores de serviço em geral.

Na situação vexatória, humilhante e angustiante vivenciada pelos usuários do péssimo serviço de transporte público no Distrito Federal parece nos inequívoca a ocorrência do dano moral. Diante da omissão das autoridades públicas do Distrito Federal e da má-fé das empresas, apenas o ajuizamento de vários processos, nos Juizados Especiais Cíveis, teria o condão de inibir o descaso das concessionárias do importantíssimo serviço de transporte coletivo público.

O dano moral,  decorre da própria ofensa ao direito de ter um transporte digno e eficiente e, portanto, não precisa ser provado. A reiterada Jurisprudência do STJ vem se orientando no sentido de não exigir prova do dano moral, pois que, na maioria das vezes, configura­se in re ipsa. Com efeito, o que pode o consumidor fazer é alegar e comprovar o ilícito praticado pelo outro, mas, a partir disso, a verificação de ocorrência de dano puramente moral deve ser procedida de acordo com regras de experiência do Julgador, já que exigir a prova de um suposto abalo psíquico seria extremamente difícil e impalpável. Preceptivo legal autorizador aplicável à espécie é o art. 335 do Código de Processo Civil, ou seja, em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial. Por força da aplicação do instituto da inversão do ônus da prova, as empresas teriam que demonstrar que o veículo que quebrou tinha condições mínimas de trafegabilidade.

Conquanto seja, realmente, desnecessário comprovar o dano moral, é importante que se demonstre que, em cada situação concreta, há uma correlação entre um determinado fato e um abalo psíquico significativo experimentado pela parte que requer a indenização. Isso porque a Jurisprudência está repleta de precedentes nos quais se reconhece a dificuldade na complexa convivência entre as pessoas, mesmo no dito mundo civilizado. É importante, pois, que o usuário demonstre o prejuízo que experimentara, como, por exemplo, a instabilidade emocional gerada no empregado que se chega atrasado ao serviço por conta da quebra dos ônibus, ou do estudante que perde aulas, sofrendo inegável prejuízo no processo educacional. Nesses casos restará patente a privação do seu bem-estar, com evidente menoscabo espiritual e perturbação anímica, haja vista o constrangimento, a humilhação e outros sentimentos negativos que ensejam a reparação do agravo. Esse abalo psíquico não carece de provas, mas deve ser apurado com base em regras de experiência, conforme sustentado pela eminente Ministra Nancy Andrighi, no julgamento do RESP 1.109.978/RS (3ª Turma, DJe de 13.09.2011) e em outros, do mesmo importe.

As constantes quebras de ônibus no Distrito Federal não podem ser considerados meros incômodos, mas ensejadores de danos morais, individuais e coletivos, eis que evidente a “a dor, o vexame, o sofrimento ou mesmo a humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, chegando a causar­lhe aflição, angústia e desequilíbrio de seu bem-estar" (STJ, RESP 1.234.549/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Massami Uyeda, DJe de 10.12.2012)”.

O dano moral passível de indenização reveste-se de afronta não patrimonial que, ao submeter o lesado à profundo vexame, constrangimento, humilhação e dor, venha causar repercussões que efetivamente afetem a condição psicológica do indivíduo, sua vida social, o convívio com os familiares, e conduza à sua baixa estima.

A indenização por dano moral deve ser graduada de modo a coibir a reincidência do causador do dano e, ao mesmo tempo, inibir o enriquecimento do lesado, devendo-se aparelhar seus efeitos dentro de um caráter preponderantemente pedagógico, para que cumpra ela as funções que lhe são atribuídas pela doutrina e pela jurisprudência. Concomitantemente, há que se atentar para as circunstâncias do caso concreto, considerando, para esse arbitramento, a gravidade do dano, a situação econômica do ofensor e as condições do lesado.

O valor da indenização, conforme o caso concreto, deve girar em torno de R$ 1000,00 (um mil reais), valor que se reveste de razoabilidade e proporcionalidade em face do constrangimento e humilhação. O valor da indenização por danos morais coletivos deve ser substancialmente maior, fala-se, aqui, de indenização que deve superar a quantia de um milhão de reais.

Para o pedido de indenização por danos morais individuais é legitimado a pessoa, o usuário do transporte público que teve seus atributos de personalidade ofendido pelo descaso das empresa que atua no sistema de transporte coletivo. O consumidor deve se valer dos serviços do Juizado Especial Cível, que conta com o serviço de redução à termo (serviço que redigirá a petição inicial). Os pedidos de indenização de até 20 salários mínimos não necessitam do patrocínio de advogado.

Para o pedido de indenização por danos morais são legitimados o próprio Distrito Federal, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a Ordem dos Advogados do Brasil, o PROCON e organismos e associações que tenham em seus estatutos o dever de defender os interesses dos consumidores. Os legitimados podem e devem agir de ofício, manejando uma ação civil pública.

Enfim, o descaso com que as empresas que exploram o transporte público no Distrito Federal, malgrado existam opiniões em sentido contrário, afigura-nos como suficiente para a responsabilização por danos morais, individuais e coletivos, eis que superam a esfera do mero aborrecimento. As ações individuais deveriam ser ajuizadas nos Juizados Especiais Cíveis do Distrito Federal. Os danos morais coletivos deveriam ser postulados em ação civil pública a ser intentada por um ou mais dos legitimados.
Fonte: Blog Saber Melhor - 07/09/2013

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