terça-feira, 20 de outubro de 2015

Pátria Educadora: O que esperar do ensino nas escolas públicas da capital

Calor, desconforto, baixa umidade e estrutura inadequada

Temperatura aferida em 02 de outubro, enquanto os alunos do Ensino Médio faziam prova de Humanas. Em uma prova valendo 5,0 pontos, 39% dos alunos não chegaram a 2,5 ,metade da pontuação da prova...


Apesar de alguns poucos se destacarem no caótico sistema de ensino público da capital, quantidade que por si só já impõe a necessidade de maior atenção, não é possível afirmar que o baixo rendimento nos exames seja culpa somente do aluno. Os críticos do sistema também apontam falhas na formação do professor e encontram na rotina diária do docente elementos que favorecem a baixa qualidade do ensino, enquanto outros, no entanto, apontam o descaso da família com a rotina escolar do aluno.

Longe da unanimidade que reconhece a causa do fracasso no ensino público, é bem verdade que boa parte no resultado da aprendizagem é remetida ao professor, principalmente àquele que conduz o ensino formal nas salas de aula. Desse profissional, a sociedade espera a competência para que ensine o aluno o conteúdo da sua matéria, o rigor para que conduza com disciplina as turmas com alunos vindos das mais diversas formações familiares, a leveza e o trato urbano para que não fira as suscetibilidades dos alunos, a amizade para que os alunos possam confiar e, a partir dessa confiança, ter maior rendimento escolar, assim como espera que esse profissional seja exemplo de conduta e admiração dos alunos.

Se essas são as características que rotulam o professor ideal para a sociedade, muitos, apesar de já terem atingido estágio mais avançado, agora entram em formação descendente e integram o quadro dos bons profissionais em extinção.

Apontar o culpado pela decadência do ensino da capital é fácil: “a culpa é do sistema”.

Dizem que do sistema é a culpa pela burocracia da rede de ensino, pelo descompasso entre teoria e prática, pela morte dos sonhos daqueles professores que acreditam que só a Educação pode mudar esse país, pelo desânimo e pela falta de vontade de fazer a diferença nas escolas, pela apatia de uma rede comandada por burocratas que datam do descobrimento nos mesmos cargos e que pouco contribuíram para a evolução do ensino, pela falta de visão política para a Educação, assim como por impor uma estrutura ultrapassada, inadequada e desconfortável para os alunos. Não que outras causas não devam ser atacadas, mas aqui impera características que obteriam a votação de muitos para determinar as causas da decadência no Ensino Público.

CONQUISTAS

As poucas conquistas que chegam não coroam os esforços dos professores, homens e mulheres que lutam pela qualidade do ensino, nem mesmo como elemento motivador. Quantos profissionais de sucesso já retornaram às suas escolas para dar um abraço na sua professora, no seu professor que o ajudou na escalada dessa montanha em que muitos despencam em queda livre? Pelo menos pra dizer, valeu professor! Quantos desses profissionais já voltaram às suas escolas para mostrar aos novos alunos que é possível vencer, e que aí está, você, um exemplo vivo dessa possibilidade, dessa conquista, que é possível fazer diferente, que é possível sonhar e construir um país melhor?

Em muitas escolas são os professores que conduzem o ensino e a estrutura nos ombros, nos braços e nos sonhos, mas anualmente o governo premia os gestores, prêmio gestão. Curioso é que a gestão, nesse caso, não é cúmplice da eficiência dos professores, pois eles não são premiados. O Dia dos Professores, por exemplo, foi criado para que as escolas com solenidades comemorassem condignamente o dia do professor, mas o prêmio maior a esse profissional é o feriado. No dia em que deveriam receber as honras, tem como honra maior ficar distante do lugar que não mais honra aqueles que o ocupa. Falar que só pela Educação será possível a ascensão é utilizar um discurso contestado diariamente pelos noticiários que mostram políticos grandes sem Educação. 

PUNIÇÃO I

Se a escola foi criada para ser local de crescimento intelectual da humanidade, essa função ela não cumpre condignamente na capital do Brasil, Pátria Educadora. Essa conclusão é facilmente chegada quando se analisa não só os dados, mas também as condições a que os alunos estão submetidos nas salas de aula.

O caos na Educação não é novidade. Dados divulgados no documentário “O Sacrifício dos Inocentes”, (íntegra www.atvdopovo.com.br ) do Jornal Tribuna Distrital, mostram que em 2012, 19% dos alunos da Educação de Jovens e Adultos abandonaram a escola sem concluir a modalidade e 19,8% por cento não foram aprovados. No Ensino Fundamental, 5.747 alunos abandonaram as escolas e 41.060 alunos foram reprovados.

Somente em Planaltina, em 2012, 13,26 % dos alunos foram reprovados no diurno e 13,05% dos alunos no noturno. Na cidade, 42,76% dos alunos abandonaram a escola no mesmo ano.

Reportagem divulgada pela Rede Globo (G1) em outubro de 2013, mostrou que no Ensino Médio o índice de reprovação na escola pública foi de 23% (17.000 alunos). Outra revelação curiosa foi feita pelo diretor de Estudos e Políticas Sociais da Codeplan, Osvaldo Russo, na apresentação do trabalho sobre a Avaliação da Educação Básica no DF, Uma Visão sobre o IDEB. Segundo ele, no Distrito Federal 76,9 % das crianças de zero a três anos não possuem cobertura de creches e 3,3% da população de dez anos ou mais não sabem ler.

Ano após ano, os problemas se repetem e os dados não mostram evolução. No primeiro semestre de 2014, por exemplo, segundo dados da Secretaria de Educação, 6.122 alunos foram matriculados no primeiro segmento da Educacação de Jovens e Adultos. Desse total, 2.023 foram reprovados e 2.065 abandonaram. Somando o abandono e a reprovação, 4.088 alunos não foram beneficiados pelo ensino noturno nesse ano.

Já para o segundo segmento, os números também não foram animadores. 22.791 alunos foram matriculados e, desse total, 5.523 foram reprovados e 9.718 abandonaram os estudos. Somado abandono e reprovação, 15.241 não foram beneficiados pelo ensino da EJA no DF em 2014.

No terceiro segmento, que engloba o Ensino Médio, 22.708 foram matriculados. 4.553 foram reprovados e 7.816 abandonaram os estudos. Se somarmos abandono com reprovação, os números mostram que mais de 50 por cento dos alunos, 12.369, que foram matriculados em 2014, não foram beneficiados pelo ensino da EJA.

Considerando a modalidade de EJA no Distrito Federal, os números são os seguintes. Dos 51.621 alunos matricuilados em 2014, 12.109 foram reprovados e 19.599 abandonaram. Somando abandono e reprovação em todo o DF, os números mostram que para 31.708 alunos não houve resultado positivo nas escolas. Com números assim, o que esperar das escolas na capital?

PUNIÇÃO II

Segundo a Norma Brasileira 17, NR 17, a temperatura ideal para uma sala de aula deve estar entre 21 e 23ºC, e o nível de ruído em 50 decibéis (DBA). Apesar da Norma recomendar a temperatura ideal para o ambiente, é difícil encontrar na capital do país uma sala de aula que tenha sido objeto de preocupação ambiental em sua construção e que ofereça conforto adequado aos alunos. A estrutura construtiva das escolas públicas no DF é inadequada para a oferta de um ensino de qualidade, essa é a constatação.

Para combater o desconforto da sala de aula e mostrar que é possível maior rendimento em ambiente confortável, o professor de Português, Davi Moreira, conseguiu em junho de 2013, com ajuda de um deputado federal de Goiás, Pedro Chaves, 10 aparelhos de ares-condicionados para o CEF 4 de Planaltina, conquista que rendeu inclusive reportagem no portal G1 (http://g1.globo.com/distrito-federal/noticia/2014/04/com-termometro-professor-registra-calor-em-sala-de-aula-no-df-39-c.html ), no Correio Braziliense (http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/eu-estudante/ensino_educacaobasica/2014/04/11/ensino_educacaobasica_interna,422635/aulas-sob-intenso-calor.shtml ) e no DFTV (https://www.youtube.com/watch?v=9uU1XlGCAA8 ) .


Apesar do tempo da conquista, 2013, da repercussão negativa com a não instalação, até hoje, outubro de 2015, nenhum aparelho foi instalado nas salas de aula para os alunos, pelo contrário, a direção da escola, que ganhou prêmio gestão em 2013, instalou 5 dos 10 aparelhos no auditório da escola, transformando-o em Teatro de Planaltina, local onde semanalmente a Regional de Ensino reúne com os diretores, forma escolhida pela direção para mostrar aos seus colegas um trabalho diferenciado. Enquanto isso, os alunos padecem no desconforto das salas de aula.

NADA MUDA

Se em 2013, a temperatura registrada pelo professor Davi Moreira na sala de aula do Centro Educacional Dona América Guimarães, em Planaltina, foi de 39,9 ºC, e que motivou a confecção do documentário “O Sacrifício dos Inocentes”, no dia 02 de outubro de 2015, alunos de outra escola pública de Ensino Médio de Planaltina enfrentaram o mesmo desconforto nas salas de aula nos dias das provas.

Se a culpa pelo desempenho insuficiente recai sobre os alunos, aqui, mais uma vez, os críticos encontram elementos em seus argumentos. Na prova de Humanas desse dia, com temperatura acima de 34 ºC na sala de aula, 39% dos alunos do 1º ano do Ensino Médio não chegaram a 2,5 pontos, metade dos 5,0 pontos da prova.

Em condições térmicas semelhantes, no dia 05 de outubro, de 38 alunos, também do 1º ano, que fizeram a prova de matemática, 9 alunos tiveram notas abaixo de 2,5, metade da pontuação da prova.

Se o sucesso do Ensino nas escolas públicas do DF depende das condições ambientais, não serão os aparelhos de ares-condicionados dos gabinetes e das salas dos diretores que farão a diferença para os alunos. Apesar de algumas escolas já terem recebido aparelhos do MEC, muitos desses aparelhos continuam no depósito. Com escolas assim, o que esperar do Ensino nas Escolas da capital?

Do autor.

Atualmente em greve, Davi Moreira dos Santos é professor concursado de Português da Educação de Jovens e Adultos no noturno e professor de Parte Diversificada (PD) 1ºs e 3ºs anos, no horário vespertino.

É também jornalista e foi o autor do documentário “O Sacrifício dos Inocentes”, mencionado anteriormente, bem como é o responsável pela foto acima (com distorção de movimento feita no photoshop para preservar a imagem dos alunos) em que mostra o termômetro com temperatura acima de 34 ºC.


Fonte: DAVI MOREIRA DOS SANTOS - 19/10/2015 - 17:20:05

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