A vida de pobre dos ricos de Vicente Pires

Por 

Ediney 

Santana

Há muitas maneiras de ser pobre além da falta de dinheiro, que sem dúvida é a mais dramática, falo isso porque sou parte dos pobres pelo viés econômico, mas há um tipo de pobreza perturbadora: o pobre de espírito. O pobre de espírito crê-se parte de um mundo regido por sua suprema vontade, não tem sentimento coletivo, ignora que ele é só uma parte dessa engrenagem e não o todo. Há ricos e pobres que padecem da pobreza de espírito.

Pobres pela falta de dinheiro sabem como é delicada a relação entre eles, (nós) e a autoridade. Um policial, juiz, promotor, deputado, governador, presidente não tratam pobretões com a mesma cordialidade que tratam um rico. Não deveria ser assim, mas o dinheiro também serve como promotor do desequilibro social do poder público. Os impostos que pobres pagam servem ao fim para que o Estado os trate de maneira desigual, o imposto do pobre pavimenta a rua do rico e esburaca a sua. Vicente Pires é um bairro de classe média e ricos, poucos pobres vivem aqui, então por que essa classe média e ricos aceitam tratamento do Estado que geralmente é destinado aos pobres?

Há mais de três anos Vicente Pires respira dia e noite poeira, poeira que pode causar doenças como: Leptospirose, pelos e dejecções de ratos contaminados podem contaminar a poeira que respiramos. Histoplasmose pode ser causada pelos fungos presentes em fezes de pombos e carregados pela poeira para os pulmões. Pneumoconiose, se a poeira tiver algum tipo de mineral, como sílica, pode causar doenças pulmonares graves e crônicas. Pneumonite, causa inflamação pulmonar. Enquanto os ricos de SHVP curtem suas casas TOPS, suas churrasqueiras TOPS, seus carrões TOPS seus pulmões são bombardeados por particulares de poeiras que um dia podem revelar doenças pulmonares graves.

A poesia e lama tem causado estrago no comércio, muito já fecharam, mercadorias perdidas, empregados doentes e nada disso parece fazer com que os moradores de SHVP cobrem energicamente (e eles tem como fazer isso) do governo providências. Poderiam cobrar, por exemplo, um emergencial tratamento antipoeira, sim isso é possível, pesquise e entenda como.

Não pense que escrevo isso para afrontar vocês, mas para chamar atenção para um problema invisível que pode tá lentamente corroendo a saúde de todos. Eu nada tenho em Vicente Pires, não tenho casa ou comércio, mas me toca essa passividade de quem pode reagir, esse esperar calmo pelo futuro que pode ser de hospital em hospital. Nunca na Asa Sul ou Norte, Penínsulas os moradores aceitariam uma condição humilhante dessas. 

No momento que escrevo esse texto minha cabeça dói , a garganta há tempos é rouca e o cansaço é constante, tudo isso por causa dessa nevoa de poeira que envolve minha casa. Se a condição econômica nos divide, a humana nos iguala, eu adoecerei, vocês também. Termino esse texto citando a parte final de “Vida e Morte Severina” de João Cabral de Melo Neto:

“Esta cova em que estás, com palmos medida

É a conta menor que tiraste em vida

É de bom tamanho, nem largo, nem fundo

É a parte que te cabe deste latifúndio”