segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Entrevista: Gilberto Carvalho: "O PT precisa se renovar"

Ministro da Secretaria Geral da Presidência da República admite que a sigla precisa se renovar do ponto de vista "da ética e da relação com a coisa pública". Em entrevista, ele define este como o "ano de maior sofrimento para o partido" e o julgamento da Ação Penal 470 como "um exagero que a história vai colocar no seu devido lugar"


Há dez anos no primeiro escalão do governo federal, o ministro Gilberto Carvalho, que hoje comanda a Secretaria Geral da Presidência da República, acredita que "o PT precisa se renovar". Segundo ele, do ponto de vista "da ética e da relação com a coisa pública". Numa entrevista à repórter Juliana Braga, do jornal Correio Braziliense, o homem que já foi braço direito do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirma que este foi o "ano de maior sofrimento da história do partido". No entanto, lembra que também foi, ao mesmo tempo, "um ano de grande vitória", já que realizou conquistas mesmo diante de "rajadas" e "saraivadas". ...
Na conversa com o jornal da capital federal, Gilberto Carvalho menciona que há agora de se fazer uma "reparação dos excessos" sofridos durante o julgamento da Ação Penal 470, o 'mensalão', segundo ele "um exagero que a história vai colocar no seu devido lugar". Questionado sobre o vídeo direcionado à militância petista em defesa de Lula, que gravou depois da publicação do depoimento do empresário Marcos Valério no jornal O Estado de S.Paulo, ele afirma ter "aproveitado o momento" para mandar uma mensagem a seus "companheiros", mas que não vê "motivo para preocupação com isso".

Leia abaixo a entrevista:

Como o PT sai deste 2012 conturbado?

Foi talvez o ano de maior sofrimento na história do partido, com o julgamento da ação penal 470 coincidindo inclusive com a questão eleitoral. Eu sempre digo que, por tudo que o PT fez pelo país, a gente não merecia que o julgamento fosse realizado naquelas circunstâncias, naquele momento de eleição em que evidentemente havia e houve uma contaminação. Foi um ano bastante difícil e termina ainda agora com essas acusações do Marcos Valério contra o Lula. Ao mesmo tempo, foi um ano de grande vitória pelo simples fato de que, com toda essa rajada, com toda essa saraivada, em que se esperava que o PT naufragasse, o partido teve vitórias — e uma muito importante, no caso de São Paulo. Claro que também fechamos com derrotas significativas, a gente tem que reconhecer isso. As mais sofridas, como Fortaleza, Porto Alegre e, principalmente, Recife, que é muito dolorosa.

Como o PT apoiará os quadros condenados no mensalão?

Temos que manter a nossa solidariedade e a defesa daquilo que, mais do que defesa, eu chamaria de reparação dos excessos que ocorreram no julgamento desse processo. Tenho muita convicção de que a história vai mostrar que esse julgamento operou, por conta do ambiente político criado, alguns erros, e sem dúvida nenhuma, um exagero que a história vai colocar no seu devido lugar. Não podemos esquecer daqueles que foram vítimas desses exageros. Aí tem uma questão da solidariedade, que é epidérmica. Não é porque um companheiro seu cometeu um erro ou foi vítima desse exagero que você vai abandoná-lo.Por outro lado, não há duvida nenhuma de que o PT precisa se renovar e se refazer do ponto de vista da ética, da relação com a coisa pública, e fazer isso não apenas olhando para os próprios erros, mas olhando para as questões estruturais da política, que induzem, ou pelo menos facilitam, essa cultura.

Qual foi o principal erro do PT nesse episódio?

O erro do PT foi um erro essencialmente de caixa dois. Eu não reconheço nada daquilo que foi colocado em termos de pagamentos mensais. Para mim, continua sendo uma falsidade. Cometemos um erro grave. Do caixa dois e do pagamento de recursos para partidos aliados em termos eleitorais, isso nós fizemos. Agora, se fosse feita uma investigação em todas as eleições do Brasil, vai se verificar que houve repasse de recurso para partidos aliados. Então espero que o partido tome como prioridade essa questão da reforma política e que haja uma coragem da nossa parte em ter muito rigor com essa postura.

A reinvenção do financiamento de campanha depende da aprovação da reforma política. Existe intenção de colocar isso em pauta?

Eu acho muito difícil. Mas os outros partidos não são menos corrompidos que o PT, isso é um engano. A regra é a mesma para todos, e todos praticam exatamente a mesma coisa que o PT pratica. E faço um desafio público a qualquer partido que consiga provar que não tenha caixa dois e que não tenha algum tipo de erro na estruturação das suas campanhas. Não existe isso.

Lula sabia do mensalão?

Eu tenho um fato, eu não sei em que dia foi, mas que formou em mim a convicção absoluta de que o Lula não acompanhava as coisas. O Lula me chamou, já com a denúncia na rua, e disse: "Gilbertinho, eu quero que você vá para São Paulo, sentar com o Delúbio, e eu quero que ele explique para você que coisa é essa que está acontecendo." Peguei um avião naquele mesmo dia, fui a São Paulo, sentei com o Delúbio no terceiro andar do Diretório Nacional, no sofá que tinha lá, e falei: "Delúbio, eu vim aqui para você me contar a história". Foi aí que o Delúbio me deu a explicação da aproximação dele com o Marcos Valério. Que, no desespero, ele teve que recorrer ao empréstimo que o Valério intermediou e, a partir daí, a relação com o Roberto Jefferson, a falta de pagamento que deu a revolta no Roberto Jefferson, enfim, aquela coisa toda. Pela luz dos olhos dos meus filhos, eu tenho absoluta certeza de que nós não estávamos acompanhando daqui, de que não sabíamos, de que o Lula não sabia.

O senhor foi criticado por gravar mensagem à militância petista sendo membro do governo...

Sou militante do PT e me sinto na responsabilidade de contribuir com o partido. Aproveitei o momento para mandar uma mensagem aos meus companheiros. Foi uma mensagem coloquial, numa linguagem própria para desafiar a militância a ir à luta. Gravei fora do expediente de trabalho e não vejo motivo para preocupação com isso. Eu sou membro do governo da presidente Dilma, mas tenho consciência de que só sou ministro porque o PT me fez.

O senhor foi convocado pelo Congresso a dar explicações sobre o passaporte especial de Rosemary Noronha. O que o senhor vai dizer?

Vou analisar ainda um pouco melhor o pedido, mas a Rosemary, ninguém pode esquecer, era funcionária do gabinete da Presidência. Todos os funcionários que acompanham viagens internacionais têm o passaporte diplomático para facilitar a tramitação. Ela teve esse passaporte no estrito cumprimento do dever funcional de acompanhar o escalão avançado das nossas viagens.

Qual o cenário para 2014 e reeleição da presidenta Dilma? E Lula, se candidata em 2014 para o governo de São Paulo?

É muito cedo para uma previsão mais precisa. O que dá pra dizer é que tudo caminha para uma reeleição. Não há nenhuma perspectiva de alteração no horizonte. Essa história de São Paulo é muito nova, eu te confesso que ainda não digeri, não sei se é o caso. Tem que olhar com muita calma. Sobre os adversários, acho natural que o PSDB se configure em torno de uma candidatura, possivelmente do Aécio. Acho natural que surjam outras candidaturas. O Eduardo Campos, nós contamos no nosso campo de aliança, mas uma eventual candidatura também não é nenhum fim de mundo. O PSB já lançou outros candidatos, tem direito de fazê-lo. Agora, nós vamos nos empenhar para tê-lo conosco.

O senhor se referiu a 2013 como o ano 13, quando o governo vai consolidar seus projetos. O que precisa mudar para deslanchar o governo?

O terceiro ano é sempre o melhor ano de um governo, do ponto de vista de produção, porque é natural que os projetos levem um tempo para amadurecer, para transcorrer os processos burocráticos, os licenciamentos, e assim por diante. Então nós temos, por exemplo, muita convicção que, do ponto de vista rodoviário, vai haver uma grande retomada. Há uma expectativa com relação a ferrovias, à retomada da Norte Sul, da Transnordestina. As hidrelétricas seguem o ritmo delas. E agora os aeroportos começam. Então a gente tem tudo para ter a convicção de que é um ano em que a máquina está rodando numa energia diferenciada.
Fonte: Brasília 247 - 24/12/2012

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