quarta-feira, 21 de outubro de 2015

O Nobel e a Economia Política

HÉLIO DUQUE*


Alvíssaras! O ganhador do Prêmio Nobel da Economia, outorga patrocinada pela Academia Real de Ciências da Suécia, demonstra a importância da economia política. O economista Angus Deaton, professor de Economia e Relações Internacionais da Universidade de Princeton, nos EUA, tem a sua obra alicerçada no desenvolvimento com bem estar social. No seu livro “A Grande Fuga: Saúde, Riqueza e as Origens da Desigualdade”, analisa o desenvolvimento ao longo de dois séculos. Ao receber a notícia da premiação, sua fala foi sobre a desigualdade entre pessoas e países, também traduzida atualmente na crise de refugiados que invade a Europa. Afirmando: “O que estamos vendo agora é o resultado de centenas de anos de desenvolvimento desigual nos países ricos, deixando boa parte do mundo para trás. Essas pessoas deixadas para trás querem uma vida melhor, e isso está colocando uma pressão enorme nas fronteiras entre os mundos rico e pobre”.

Não é um tecnocrata da economia para quem a macro e a micro economia deve servir apenas a produção da riqueza concentradora da renda. O economista Angus Deaton entende que o sistema econômico é constituído por um conjunto de grupos sociais e amplos setores produtivos interligados entre si. Resgata a essencialidade da economia política desde os tempos pré-capitalistas. Daí o professor Tyler Cowen, economista da Universidade George Mason, dos EUA, assim se referir ao ganhador do Prêmio Nobel: “Pensem em Deaton como um economista que olha de perto o que os lares pobres consomem para ter uma ideia melhor de seus padrões de vida e de possíveis caminhos para o desenvolvimento econômico. Penso nisto como um prêmio para o empirismo, a importância do desenvolvimento econômico, e indiretamente como um prêmio para a história econômica”.

Infelizmente, a partir do pós-guerra, a economia política foi rebaixada para ser vista como apenas economia, considerada Ciência Econômica. Nada mais equivocado. Ela é uma ciência social e não, como querem fazer entender, uma ciência exata. A inflexão da suposta exatidão tem na matemática, na econometria, na estatística e matérias afins, ministradas nos cursos de economia, instrumentos para a análise da realidade quantificável. Só isso. Enquanto a economia política enfoca, como faz o Nobel de Economia, a sobrevivência humana, valorizando as relações sociais, entendendo que a economia, além da produção, deve ocorrer a distribuição dos bens pelos quais o ser humano atende as suas necessidades básicas. Traduzindo: produção e distribuição constitui a base do processo econômico.

Em 1615, no auge da Revolução Comercial, ao escrever “Traité de d’économie Politique”, o francês Antoine Montchrestien, fundamentava a relação na sociedade das classes detentoras de capital, os proletários e os latifundiários. Defendia que não se deveria separar o adjetivo política do substantivo economia. Anos depois, nos primórdios da Revolução Industrial, quando Adam Smith lançou “A Riqueza das Nações”, produziria a grande obra de economia política, fundamentada na tese da estar a justiça social diretamente vinculada ao progresso econômico, sendo o mercado o principal regulador na construção e geração da riqueza nacional.

A história, a sociologia e a teoria política são partes da economia política, compondo a estrutura da vida em sociedade, no Estado e na própria cidadania. Ao laurear o economista Angus Deaton, com o Nobel de Economia, a academia sueca clarifica que a economia tecnocratizada, despida de preocupação social, é falsificadora da realidade. Os brasileiros estão, nos dias atuais, conhecendo as falácias perversas do que é a burocracia estatal da economia tecnocratizada.

Helio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.

Fonte: Tribuna da Imprensa

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